O Que Pensava Parmênides?

Entre os primeiros filósofos, Parmênides de Eleia (530-460 a.C.) merece destaque por ter promovido uma mudança na filosofia. Para entendermos essa mudança, vamos relembrar o que diziam os filósofos anteriores a ele. Em um outro artigo aqui no site vimos que pensadores como Tales de Mileto, Anaximandro e Anaxímenes tinham em comum a ideia de que a natureza da realidade e aquilo que dá origem para tudo o que existe, era uma substância primordial denominada por eles como arché.

Para Tales, era a água, para Anaximandro, o ápeiron ou o indeterminado, e para Anaxímenes essa substância seria o ar. Note que cada um desses filósofos deu uma resposta diferente para o que é a arché, contudo, concordavam que ela é um elemento físico. Ou seja, chegaram nessas respostas porque estavam em busca de um elemento físico que estivesse presente em todas as coisas e que fosse a origem de todas as coisas.

Parmênides é o primeiro filósofo que irá propor que o fundamento da realidade não é algo físico, mas sim, intangível, que só pode ser alcançado pelo nosso pensamento. Para ele, o fundamento de toda a realidade é o SER. Mais abaixo entraremos em mais detalhes sobre o que era esse Ser de Parmênides. Vamos primeiro entender como ele chegou a essa conclusão.

  

Dóxa e Episteme: O Caminho da Verdade

Parmênides viveu há mais de 2.500 anos e a única coisa que nós temos sobre o seu pensamento são fragmentos de um poema sobre a natureza. Esse é o título do poema Sobre a Natureza ou Da Natureza.

Esse poema narra a subida de Parmênides até um monte. Lá no alto desse monte ele encontra uma deusa que lhe fala para sobre o caminho do conhecimento. E em relação ao conhecimento, a deusa informa que há dois caminhos.

Um é o caminho da dóxa, palavra grega que pode ser traduzida como opinião, e o outro é o caminho da episteme, que em grego significa conhecimento verdadeiro. A dóxa é um tipo de conhecimento ligado aos sentidos e que varia de uma pessoa para a outra.

Você já deve ter ouvido o ditado que diz que cada um tem a sua opinião. Justamente por isso, nós não podemos formar um conhecimento verdadeiro no caminho da opinião, pois é algo que vai variar de uma pessoa para a outra. Nós formamos nossas opiniões através das experiências e sensações que temos sobre as coisas e cada um sente e percebe as coisas de um modo diferente. Portanto, se tentarmos construir um conhecimento através da dóxa, corremos o risco de cairmos em erro.

Já a episteme refere-se a um tipo de conhecimento que está relacionado à nossa razão. A razão, a capacidade de pensar e raciocinar, é algo comum a todos. Portanto, o conhecimento que é construído através da razão pode nos levar a um conhecimento seguro e verdadeiro, pois o conhecimento obtido assim não irá variar. Pense, por exemplo, em uma equação de matemática, que é um conhecimento racional: o resultado será sempre o mesmo, independente da pessoa que fizer a resolução da equação.

No poema, a deusa mostra essas duas opções de caminho para o conhecimento para Parmênides e, obviamente, ele escolhe o caminho da episteme. E em seguida a deusa diz para ele algo que é totalmente óbvio, mas também é totalmente novo para o pensamento dos primeiros filósofos. 

O Ser é. O não-ser não é.

Futuramente, no pensamento de um filósofo chamado Aristóteles, isso ficará conhecido como princípio de identidade.

  

O Ser

O que nos resta agora é tentar entender esse enunciado, que parece óbvio, mas não é tão óbvio assim quando o analisamos de forma mais detalhada. 

O ser é o conceito mais geral, o mais amplo de todos, porque podemos dizer que qualquer coisa é e a partir disso estabelecer várias relações entre as coisas. Por exemplo, se dissermos, sobre a imagem abaixo: este círculo é azul, estaremos usando o verbo ser no presente para falar desse círculo. 

Estabelecemos uma relação entre dois conceitos: a forma geométrica do círculo com a propriedade de ser azul. Só conseguimos estabelecer relações conceituais desse tipo através do verbo ser. Ainda poderíamos dizer: isto é um círculo. E o ser aparece novamente. Ou ainda: o círculo é uma forma geométrica, e o verbo ser vem auxiliar na explicação. Perceba como o Ser está presente em quase tudo que falamos.

Quando eu me apresento, digo: eu sou o professor de Filosofia. Novamente utilizo o verbo ser para falar sobre a minha profissão. Eu poderia trocar o círculo acima por qualquer objeto e nós iríamos perceber que o verbo ser surgiria para nos ajudar a explicar e dizer o que é esse objeto.

Ou seja, tudo é, qualquer coisa é um Ser.

Com isso, nós podemos concluir que o Ser não é apenas um verbo, mas uma propriedade de tudo que existe, ele aparece como a propriedade essencial de todas as coisas. Antes de percebermos as qualidades das coisas, existe uma outra propriedade que é essencial a tudo que existe. Antes de alguma coisa ter determinada cor, determinado tamanho, determinada forma, essa coisa é. Tanto você quanto eu, assim como os objetos, compartilhamos dessa mesma propriedade de tudo que existe que é o Ser.

E o não-ser? O não-ser é o contrário do Ser. É aquilo sobre o que não se pode afirmar nada. Pois o não-ser não existe. Só existe o Ser.

Após a descoberta dessa propriedade essencial das coisas, Parmênides apresenta os atributos ou características do ser.

   

Características do Ser

1. O Ser é eterno

O Ser é algo que não nasceu e que nunca vai morrer, porque tanto o nascimento quanto a morte fariam o Ser deixar de Ser e se tornar um não-ser.

2. O Ser é uno e indivisível

Se o ser é o conceito mais amplo, você não pode imaginar que existem vários seres. Pois o que iria diferenciar um ser do outro? Não existe outra coisa além do ser. A única coisa diferente do ser é o não ser. E o não-ser não existe.

3. O Ser é imutável

Significa que ele não pode se alterar. Qualquer alteração faria o Ser se tornar um não-ser.

4. O Ser é imóvel

O ser não pode se mover no sentido de se modificar, pois ele também deixaria de ser e se tornaria um não-ser.

Com isso, Parmênides apresenta uma solução para o problema do movimento e da mudança que preocupava os primeiros filósofos.

Vejamos um exemplo: a cada dia que passa nos transformamos um pouco mais: envelhecemos um pouco mais, adquirimos mais conhecimento e novas experiências. Tudo isso nos leva a processos de transformação. E por mais que você se transforme e mude, ainda haverá algo em você que será essencial, que te levará a se reconhecer toda vez que se olhar no espelho. O mesmo acontece em relação a outra pessoa. Você pode ficar anos sem ver uma pessoa que conhece e essa pessoa pode ter mudado bastante nesse período. Mas mesmo após tantas mudanças, ainda será possível para você reconhecer essa pessoa. O que garante isso é o Ser. A essência compartilhada por toda a realidade e por todas as coisas que existem.

 

Aparência e Essência

O movimento das coisas, a mudança que nossos sentidos percebem, é apenas uma aparência, uma característica superficial da realidade. Dessa forma, podemos dizer que assim como existem dois caminhos para o conhecimento, existem duas dimensões da realidade. A dimensão da aparência e a dimensão da essência.

Somente uma delas é o caminho da verdade. As coisas, antes de apresentarem suas características aos nossos sentidos, são, ou seja, existem.

Como podemos conhecer o ser?

Os nossos sentidos, a nossa opinião, teriam a capacidade de chegar até essa essência? Até essa natureza das coisas que é o Ser?

Para Parmênides, os sentidos, as sensações, a opinião, não são os melhores instrumentos para se conhecer o Ser, pois eles irão captar apenas a realidade aparente, que é a mudança e não a verdadeira essência das coisas que é captada por nossa razão e raciocínio. O ser só pode ser conhecido pela razão.

Caso você queira ver esse conteúdo em forma de videoaula, confira abaixo.

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Bons estudos!



Raphael Rodrigo

Escritor, Professor e Pesquisador

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