Sócrates: Alma, Autoconhecimento e Maiêutica

 

A Morte de Sócrates, Jacques-Louis David, 1787

Oposição aos Sofistas

Sócrates viveu na cidade-estado de Atenas, na Grécia Antiga, por volta de 470 a 399 a.C. É considerado por muitos historiadores como um dos principais filósofos do período clássico, tanto que chega a ser um marco de divisão. Mas o que é que Sócrates traz de tão inovador para o pensamento de sua época que fez com que merecesse todo esse destaque? Para entender essa questão, precisamos ter em mente que Sócrates viveu no mesmo período histórico que os Sofistas.

Os Sofistas introduziram uma concepção relativista da realidade, sustentando a ideia de que não existem verdades absolutas, pois esta é construída pelos seres humanos através do discurso. Certo e errado seriam apenas convenções entre as pessoas e não regras universais. Ou seja, o que é errado em um lugar pode não ser errado em outro lugar.

Além disso, os Sofistas ensinavam retórica, a arte de bem argumentar, e cobravam por isso. Como não existia na concepção dos Sofistas uma ideia de verdade universal, cada um podia pegar o seu ponto de vista, transformar aquilo numa verdade e convencer outras pessoas, através do discurso, de que sua verdade era a correta; e assim convencer outras pessoas a defender os seus interesses particulares.

Sócrates não está apenas vivendo na época dos Sofistas. Ele começa a construir o seu pensamento fazendo oposições e críticas a esses pensadores.

Ao contrário dos Sofistas, Sócrates não cobrava por seus ensinamentos. Ensinava gratuitamente pois acreditava que não se deve cobrar para repassar o conhecimento. Enquanto que para os Sofistas não existia uma verdade ou o certo e o errado, Sócrates acreditava que existia uma verdade universal e essencial que podemos descobrir através do exercício do nosso pensamento e do diálogo. E enquanto os Sofistas se diziam sábios, Sócrates dizia que nada sabia.

 

A Alma e o Cuidado de Si

Sócrates promove uma divisão dentro da história da filosofia porque vai mudar o tema da investigação filosófica. Enquanto os primeiros filósofos se preocupavam com o estudo da natureza e a essência da realidade, Sócrates se preocupava com a essência do ser humano. Por isso, o período em que Sócrates esteve em atividade é conhecido como o período antropológico da filosofia clássica.

Como Sócrates se preocupava com a essência do ser humano, precisamos entender o que ele pensava ser essa essência. Para ele, a essência do ser humano é a alma. Mas o que ele queria dizer por alma? A alma é nossa razão, a nossa atividade pensante, é nossa personalidade moral e intelectual, ou ainda aquilo que hoje nós chamamos de eu.

Para Sócrates era fundamental que a pessoa tivesse um cuidado de si, que conhecesse a si mesma, para desenvolver um autoconhecimento através da compreensão da sua própria essência, que é a alma. Se a essência do ser humano é a alma, cuidar de si significa cuidar da própria alma.

E como é que cuidamos da alma?

A alma, para Sócrates, busca conhecimento e verdade.

É através do conhecimento que uma pessoa pode se tornar virtuosa na visão socrática. E através desse pensamento, Sócrates vai estabelecer a distinção entre virtude e vício

·         Virtude é conhecimento;

·         Ignorância é vício.

Essa afirmação significa que conhecimento e moralidade estão intimamente relacionados. E para que essa ideia fique mais clara, devemos entender o que Sócrates compreendia por conhecimento.

 

Maiêutica

Para se chegar ao conhecimento, Sócrates desenvolveu um método de diálogo conhecido como maiêutica. Sócrates acreditava que o verdadeiro conhecimento surge da conversa. Esse é um dos motivos pelos quais Sócrates não deixou nada escrito, tudo o que sabemos sobre Sócrates é através do que outros filósofos da sua época escreveram sobre ele.

E a base dessas conversas, desses diálogos socráticos, é sua máxima só sei que nada sei. Essa máxima revela uma sabedoria em reconhecer a própria ignorância. Ou seja, você só pode buscar o saber a partir do momento em que tiver humildade de reconhecer que é ignorante. A partir desse momento, você se abre para o diálogo, e através do diálogo você caminha cada vez mais em direção ao conhecimento e à virtude. Normalmente se divide o método socrático em duas etapas, mas vocês podem encontrar manuais que fazem até quatro divisões.

Mas vamos ficar com apenas duas etapas, duas divisões, para ficar mais conciso. Nessa divisão em duas etapas, começaremos pela ironia.

 

1º Etapa: Ironia Socrática

Dentro do método de Sócrates, ironia significa perguntar fingindo ignorar.

Costuma-se dizer que essa é a fase destrutiva do diálogo com Sócrates. O argumento do debatedor era desmontado, destruído. Mas isso não era por acaso.

Antes de passarmos para a próxima etapa do método, vamos ver um exemplo dessa fase destrutiva do método socrático através de um trecho do filme Sócrates, de 1971, do diretor italiano Roberto Rossellini.


A ideia de Sócrates, ao destruir o argumento de um debatedor, era que tanto ele quanto o debatedor passassem para a próxima etapa do método, que é a maiêutica.

 

2º Etapa: Maiêutica

Maiêutica em grego significa parto. Essa etapa do método foi chamada assim em homenagem à mãe de Sócrates, que era parteira. Enquanto sua mãe auxiliava no parto de crianças, Sócrates afirmava auxiliar no parto de ideias. O propósito de Sócrates era que, destruindo o argumento do debatedor, os dois pudessem, através de diálogo, construir, trazer à luz, uma nova ideia sobre aquilo que estavam investigando.

 Como no exemplo que vimos do filme, Sócrates quer descobrir o verdadeiro significado, o verdadeiro conceito de beleza. Através do diálogo sobre alguma coisa, nós podemos chegar ao conceito, à essência dessa coisa, que seja aceita por todos. Chegar a uma ideia universal sobre aquilo que se investiga seria o verdadeiro conhecimento.

Por exemplo, imaginemos que Sócrates quer saber o que é justiça. Geralmente, se você perguntar para alguém o que é justiça, a pessoa vai lhe dar exemplos de atos que sejam considerados justos, mas não irá responder o que é justiça. Quando Sócrates pergunta o que é justiça, quer saber o que é justiça em si mesmo. Ele não procura apenas por exemplos de atos justos, mas sim, pelo conceito, o que tem em comum entre todos os atos justos. E com isso Sócrates também mostra que várias pessoas usam as palavras sem realmente saber o que elas significam. E é nesse sentido que conhecimento, virtude e moralidade estão interligados na visão de Sócrates.

Conhecendo a essência das coisas, as pessoas irão fazer aquilo que é certo, aquilo que é verdadeiro. E fazendo o que é certo, as pessoas serão virtuosas, ao passo que a ignorância vai levar as pessoas a agir de modo vicioso.

 

A Condenação de Sócrates

Com suas indagações, Sócrates acabou provocando os poderosos de seu tempo e foi, portanto, acusado de duvidar dos deuses da cidade, de ir contra a democracia grega e de corromper a juventude. Foi levado a um júri popular que decidiu por sua condenação. Foi sentenciado à morte por ingestão de cicuta, um veneno extraído de uma planta com o mesmo nome. Contudo, Sócrates teve a oportunidade de fugir desse destino: o júri permitiu que ele escolhesse ser expatriado (perder a sua pátria) ou ingerir o veneno.

Defendendo seus ideais, Sócrates ficou com a segunda opção e aceitou a morte que lhe foi imposta com certa tranquilidade.

Esses foram apenas alguns aspectos do pensamento socrático. Se quiser esse conteúdo no formato de videoaula, confira abaixo.

Bons Estudos!



Raphael Rodrigo

Escritor, Professor e Pesquisador

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